Por Francisco Antônio Soto Vidal
Há cerca de duas décadas, a proliferação de vendedores ambulantes no centro de Pelotas levou à necessidade de um local onde eles tivessem bancas fixas, ou seja, deixassem de ser "ambulantes" (a palavra sugere caminhada, deslocamento).
Desde antes da construção, o lugar ficou com o apelido pejorativo de "camelódromo", depois suavizado para "shopping popular". Na cultura hispânica, conhecem-se como mercados persas, pelo costume árabe de vender em feiras. No Brasil, o mercador de miudezas ficou como camelot, de igual significado no francês.
O elemento grego dromo significa "corrida ou corredor" (substantivos). Daí saíram: autódromo e aeródromo, o neologismo brasileiro sambódromo, o termo médico dromomania (correr compulsivo) e o dromedário (camelo corredor). O elemento perdeu o conteúdo de deslocamento quando inventamos os fumódromos (espaços para fumar, sem movimento). Outra ideia brasileira, os camelódromos, acrescentaram uma ambiguidade: podem ser um corredor para camelos ou para camelôs. Ambos teriam um pé no Médio Oriente.
No aspecto legal, ninguém se importou com os camelôs serem comerciantes informais, que não pagam impostos normalmente, como o fazem os empresários estabelecidos. O povo denomina os produtos baratos como "piratas" (falsificados ou "fora-da-lei"), denunciando o lado negativo da atividade.
O primeiro camelódromo pelotense ia ser vertical (numa espécie de edifício, com vários pisos sem acabamento), mas a construção não deu certo. A opção foi um quarteirão baldio, vizinho à antiga Praça dos Enforcados, onde há um século passava um braço do Arroio Santa Bárbara (ainda se vê a ponte da Marechal Floriano com Santos Dumont).
Do outro lado da Floriano, situa-se a Receita Federal, onde as leis se cumprem com rigor, na área comercial e financeira. A impressão, no entanto, é que a União patrocina o comércio marginal. Em nosso país, fingimos cumprir a legalidade, mas legalizamos a improvisação e toleramos a corrupção. É o nosso Brasil dividido em dois.
Hoje, nosso respeitado camelódromo é visitado por pobres e ricos que buscam um produto barato e descartável, enquanto dezenas de outros ambulantes já se instalaram nas calçadas. Pelos corredores de nosso "mercado popular", quem fica fixo são os ex-ambulantes e quem corre são os compradores.
Há cerca de duas décadas, a proliferação de vendedores ambulantes no centro de Pelotas levou à necessidade de um local onde eles tivessem bancas fixas, ou seja, deixassem de ser "ambulantes" (a palavra sugere caminhada, deslocamento).
Desde antes da construção, o lugar ficou com o apelido pejorativo de "camelódromo", depois suavizado para "shopping popular". Na cultura hispânica, conhecem-se como mercados persas, pelo costume árabe de vender em feiras. No Brasil, o mercador de miudezas ficou como camelot, de igual significado no francês.
O elemento grego dromo significa "corrida ou corredor" (substantivos). Daí saíram: autódromo e aeródromo, o neologismo brasileiro sambódromo, o termo médico dromomania (correr compulsivo) e o dromedário (camelo corredor). O elemento perdeu o conteúdo de deslocamento quando inventamos os fumódromos (espaços para fumar, sem movimento). Outra ideia brasileira, os camelódromos, acrescentaram uma ambiguidade: podem ser um corredor para camelos ou para camelôs. Ambos teriam um pé no Médio Oriente.
No aspecto legal, ninguém se importou com os camelôs serem comerciantes informais, que não pagam impostos normalmente, como o fazem os empresários estabelecidos. O povo denomina os produtos baratos como "piratas" (falsificados ou "fora-da-lei"), denunciando o lado negativo da atividade.
O primeiro camelódromo pelotense ia ser vertical (numa espécie de edifício, com vários pisos sem acabamento), mas a construção não deu certo. A opção foi um quarteirão baldio, vizinho à antiga Praça dos Enforcados, onde há um século passava um braço do Arroio Santa Bárbara (ainda se vê a ponte da Marechal Floriano com Santos Dumont).
Do outro lado da Floriano, situa-se a Receita Federal, onde as leis se cumprem com rigor, na área comercial e financeira. A impressão, no entanto, é que a União patrocina o comércio marginal. Em nosso país, fingimos cumprir a legalidade, mas legalizamos a improvisação e toleramos a corrupção. É o nosso Brasil dividido em dois.
Hoje, nosso respeitado camelódromo é visitado por pobres e ricos que buscam um produto barato e descartável, enquanto dezenas de outros ambulantes já se instalaram nas calçadas. Pelos corredores de nosso "mercado popular", quem fica fixo são os ex-ambulantes e quem corre são os compradores.
Francisco Antônio Soto Vidal, 49, é psicólogo formado no Chile, mestre em Saúde e Comportamento (UCPel, 2010), editor do blogue Pelotas, Capital Cultural (aqui) e etimologista autodidata. É colaborador do Alquimia com a seção Palavras sobre Palavras. Com este texto, acabou por colaborar também com Histórias de Pelotas.
A equipe da Santa Mônica agradece a Francisco e deseja a todos uma excelente semana!
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